Zeca Dirceu: mais recursos para os municípios

A decisão demagógica de reduzir o ICMS na gestão passada deixou municípios em uma situação de crise. Para enfrentar o problema o governo Lula quer taxar super-ricos e enfrentar estruturas arcaicas Em razão da irresponsabilidade do governo passado, que reduziu o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) aplicado a combustíveis, comunicações e energia, os municípios brasileiros têm sentido na carne as dificuldades causadas pela redução de receitas. Foi uma medida demagógica, às vésperas das eleições, que contribuiu de forma decisiva para a crise por eles hoje enfrentada. Mas há luz no fim do túnel. Como relator do projeto de lei complementar n° 136/2023, de autoria do governo Lula, que formaliza o acordo já homologado pelo STF (Supremo Tribunal Federal) pelo qual a União se compromete a compensar estados e municípios pelas perdas causadas pela redução do ICMS, vislumbro uma solução. Há ainda negociações para o fechamento do texto, mas é possível que o relatório seja concluído antes de 7 de setembro. O requerimento de urgência apresentado ao PLP já entrou na pauta da Câmara. O tema foi objeto de reunião nesta semana, na Liderança do PT na Câmara, com representantes de entidades representativas dos municípios – Confederação Nacional de Municípios (CNM), Frente Nacional de Prefeitos (FNP) e Associação Brasileira de Municípios (ABM).  Pela proposta em curso, os estados serão compensados em R$ 27 bilhões, com 25% desse montante – R$ 6,75 bilhões – para as prefeituras. Em princípio, a compensação seria feita ao longo dos próximos três anos, de forma parcelada, até 2025. Mas, a pedido das prefeituras, deverá haver adequação dos repasses da cota parte às necessidades municipais, a depender da engenharia financeira e do orçamento da União. Muitos esforços têm sido empreendidos desde já para enfrentar o problema. Nesta semana, a Câmara aprovou, com apoio da Bancada do PT, o projeto de lei (PL 334/23), do Senado, que prorroga até dezembro de 2027 a desoneração da folha de pagamentos para 17 setores da economia dentre os que mais geram emprego no país.  O texto também prevê, até 2027,  a diminuição da contribuição previdenciária dos municípios de 20%, como é hoje, para percentuais entre 8% a 18%, tanto menores quanto menor for o Produto Interno Bruto (PIB) per capita de cada cidade. Ou seja, quanto mais pobre o município for menor será a contribuição. Já é um fôlego para os gestores. Foi uma saída emergencial. Mas o ponto central é que temos de enfrentar questões estruturais para definir de vez as fontes  adequadas para o financiamento público, evitando o açodamento de soluções mitigatórias e pontuais. É bom que se diga também que uma das causas da redução das receitas dos municípios é a altíssima e criminosa taxa de juros decretada pelo Banco Central, que afeta frontalmente as atividades econômicas e limita o avanço do consumo da população e, logo, da arrecadação de impostos, inclusive daqueles que compõem o FPM. O governo do presidente Lula apoia o municipalismo, mas ao mesmo tempo quer transformar estruturas arcaicas que ainda permanecem, como o nosso sistema tributário. É preciso criar formas de arrecadação, taxar os bilionários do andar de cima, os super-ricos. Aliás, nessa área, já há em tramitação uma Medida Provisória e um projeto de lei enviados nesta semana pelo Governo Federal. Se isso tivesse sido feito no passado, os prefeitos não estariam com o pires na mão, porque grande parte do que for arrecadado com esses tributos, que defendemos e já tentamos aprovar por mais de décadas, é partilhada com estados e municípios. É preciso socorrer os setores da economia e os municípios, mas o País não pode abrir mão de criar novas fontes de arrecadação, que não se apoiem no setor produtivo e na classe trabalhadora. Espero que a Câmara dos Deputados tenha essa capacidade de equilíbrio, tão necessária nesse momento decisivo do País, para criarmos um novo marco legal com justiça tributária e social.  • Zeca Dirceu é deputado federal pelo Paraná, também é líder do PT na Câmara dos Deputados

Taxação dos Super-Ricos

Lula assina medida provisória para taxar fundos; estimativa do governo é que regra alcance 2,5 mil brasileiros O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou no final do mês de agosto uma medida provisória (MP) que prevê a cobrança de 15% a 20% sobre rendimentos de fundos exclusivos (em que há um único cotista). Segundo estimativas do governo federal, há cerca 2,5 mil brasileiros com recursos aplicados nesses fundos, que acumulam R$ 756,8 bilhões e respondem por 12,3% dos fundos no país. Embora não haja limite mínimo de aplicações, estima-se que os investidores desse tipo de fundo devam ter patrimônio mínimo de R$ 10 milhões, já que os custos de manutenção podem somar R$ 150 mil por ano, por isso são conhecidos como fundos dos super-ricos. Por ser uma medida provisória, o texto tem validade imediata, mas precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional em até 120 dias ou perde a validade. O anúncio do envio da MP foi feito durante um evento, no Palácio do Planalto, em que o presidente Lula sancionou a lei que reajusta o salário mínimo e amplia faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF).   Durante o evento em que o presidente assinou a MP, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu as medidas de taxação de fundos e investimentos no exterior. Segundo ele, não há nenhum sentimento de “revanche” contra os mais ricos, mas uma perspectiva de estabelecer justiça social e um sistema tributário mais equilibrado. Além disso, Haddad afirmou que as iniciativas estão em linha com legislações de países capitalistas mais desenvolvidos da Europa, da América do Norte e também da América do Sul.   “Estamos olhando para os países da OCDE [Organização para o Cooperação e o Desenvolvimento Econômico], estamos olhando para os nossos vizinhos mais desenvolvidos, mais bem arrumados, o caso do Chile, da Colômbia. Estamos olhando para os Estados Unidos, para a Europa. Estamos olhando para as boas práticas do mundo inteiro e procurando estabelecer, e nos aproximar, tentativamente, daquilo que faz sentido do ponto de vista da justiça social. Aqui não tem nenhum sentimento que não seja o de justiça social”, declarou.  O texto da MP dos super-ricos, como batizado pelo próprio governo, determina que a cobrança será realizada duas vezes ao ano, diferentemente do que ocorre atualmente, em que a tributação é realizada apenas no resgate. Será tributado com alíquota de 10% quem optar por iniciar a arrecadação em 2023. A previsão da área econômica é arrecadar R$ 24 bilhões entre 2023 e 2026. Da Redação/ Fonte: EBC

Entrevista: Mercadante pretende dobrar concessão de financiamentos

O presidente do BNDES anuncia R$ 20 bilhões em linha de crédito para inovação, assim como 50 bilhões para outros projetos ainda neste ano A Federação e o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp e Ciesp) e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)  realizaram no mês de junho, seminário para discutir as diretrizes e estratégias de fomento de crédito para o desenvolvimento produtivo, a inovação e o acesso das pequenas e médias indústrias. Também firmaram convênio para estreitar a cooperação entre as entidades. Durante o evento, o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, respondeu algumas perguntas para a imprensa e a revista Prefeitos & Governantes. Confira a seguir! Prefeitos & Governantes – Como está o clima econômico? Aloizio Mercadante – Nós estamos começando a viver um ambiente econômico em que já está dando para respirar. O Brasil foi o quarto país que mais cresceu no mundo, está se recuperando, a inflação caiu fortemente, e está entre as menores inflações em termos de economia mundial. Prefeitos & Governantes – O BNDES pretende apoiar a pequena e média indústria daqui pra frente? Aloizio Mercadante – O BNDES quer apoiar a pequena e média indústria também, irrigando o mercado com crédito. O banco trabalha para lançar um novo cartão BNDES nos próximos três ou quatro meses. Nosso plano é dobrar os desembolsos da instituição para 2% do Produto Interno Bruto (PIB), retomando o patamar histórico. Agentes do banco irão percorrer o interior do estado para realizar encontros com empresários locais e explicar como realizar negócios com o BNDES. Prefeitos & Governantes – O BNDES pretende financiar projetos nos municípios ainda neste ano? Aloizio Mercadante – Sim, o BNDES pretende financiar R$ 50 bilhões em projetos neste ano. Esse valor representa o dobro do ano passado. Trouxemos um pouco a nossa carteira de projetos, que está muito forte. Tivemos crescimento de 207% em novos projetos que deram ingresso no BNDES. E nesse ano a perspectiva é financiar R$ 50 bilhões, o dobro do ano passado. Prefeitos & Governantes – Na sua opinião, o BNDES precisa de novos instrumentos para atender o setor público? Aloizio Mercadante – O  BNDES precisa de novos instrumentos de financiamento para atender às políticas públicas em elaboração, como o novo Programa de Aceleração do Crescimento, a nova política industrial e o Pacote de Transição Ecológica, também chamado de Pacote Verde. Prefeitos & Governantes – Acredita que há muita pressão nesse setor? Aloizio Mercadante – Existe uma forte pressão por investimentos, há uma grande motivação para investimento nesse novo ambiente, há expectativa de queda da taxa de juros e de novos instrumentos de financiamentos que acelerem investimentos. O banco já financiou mais exportações no primeiro semestre que em todo o ano passado e elevou em 56% o financiamento a micro, pequenas e médias empresas neste ano. Prefeitos & Governantes – E com relação à área digital, o que esperar daqui para frente? Aloizio Mercadante – Em breve, o banco concederá financiamentos à inovação e à digitalização atrelados à Taxa Referencial (TR), que totalizará no máximo 3% ao ano. Isso deve contribuir para acelerar os investimentos da indústria. Os financiamentos tradicionais do BNDES são corrigidos pela Taxa de Longo Prazo (TLP), que segue a cotação de mercado de títulos públicos vinculados à inflação. Prefeitos & Governantes –  E sobre o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), o que esperar? Aloizio Mercadante – Há um déficit do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), uma das principais fontes de recursos do BNDES. Pelas estimativas do governo, o Fundo deve encerrar o ano com déficit de R$ 4,3 bilhões, mesmo recebendo aporte de R$ 1,7 bilhão do Tesouro. O Congresso precisa resolver a destinação de recursos do fundo, que passou a destinar parte dos recursos à Previdência Social após a aprovação da reforma da Previdência. A equação do FAT tem de passar pelo Congresso Nacional. O FAT não foi concebido para financiar a Previdência Social. Prefeitos & Governantes – Qual será o valor liberado em crédito para os próximos anos, principalmente para a Indústria? Aloizio Mercadante – A taxa de juros será de 1,7% ao ano. Aprovamos R$ 20 bilhões do BNDES para os próximos quatro anos, em inovação, com uma taxa de juros de 1,7% ao ano. Pode ir para o BNDES quem quiser fazer inovação que vai ter dinheiro, a juros baratos. E estamos abrindo mais uma linha [a segunda], de mais R$ 2 bilhões, que pode chegar a R$ 4 bilhões, para a indústria exportadora poder se financiar nas mesmas condições que fizemos para a agricultura. A taxa de juros fixa para essa linha de crédito será de 7,5%, em dez anos, com dois anos de carência. Prefeitos & Governantes – Então vão abrir mão do spread do banco? Aloizio Mercadante – Estamos pagando R$ 2 bilhões e reduzindo em 61% o spread [diferença entre o preço de compra e venda de um ativo ou uma transação financeira] do BNDES. Estamos indo para o osso. Estamos praticamente abrindo mão do spread do banco para ajudar a indústria a exportar. Prefeitos & Governantes – Na sua opinião, o que a Indústria do Brasil precisa daqui para frente para se desenvolver mais? Aloizio Mercadante – Precisa de um programa nos moldes do Plano Safra, de fomento à produção rural. Precisamos, sim, de um plano safra para a indústria. Não me venham falar que subsídio é jabuticaba. Jabuticaba é ter a maior taxa de juros com uma das menores inflações do planeta, que é o que temos hoje. Subsídio não é jabuticaba quando é transparente, bem aplicado e direcionado para setores estratégicos. Edição:Diana Bueno/ Entrevista realizada durante a coletiva de imprensa realizada no mês de junho durante evento do BDES e FIESP

Agenda ESG

Práticas que ganham espaço no ambiente corporativo também podem melhorar as ações no setor público O interesse de busca pelo termo ESG no Brasil praticamente triplicou nos últimos 12 meses até fevereiro de 2022. As buscas pelo tema cresceram 150% na comparação aos 12 meses anteriores, de acordo com levantamento do Google Trends feito a pedido do Valor. O Brasil foi o país latino-americano que mais pesquisou pela sigla ESG nos últimos 12 meses e um dos 25 países no mundo que mais buscou pela temática no período. Em 2021, o interesse em ESG bateu recorde no país; ou seja, nunca os brasileiros buscaram tanto pelo assunto quanto no ano passado! Mas será que todos sabem o que é, de fato, ESG, sua origem e importância, especialmente para o setor público? Significado Primeiramente, vale entender o que significa cada letra do acrônimo “ESG”. A sigla vem do inglês Environmental (Ambiental, E), Social (Social, S) e Governance (Governança, G). No Brasil, também nos referimos a ela como ASG. Conheça em detalhes: Environmental ou Ambiental: refere-se às práticas da empresa ou entidade voltadas ao meio ambiente. Entram aqui temas como aquecimento global; emissão de gases poluentes, como o carbono e metano; poluição do ar e da água; desmatamento; gestão de resíduos; eficiência energética; biodiversidade; entre outros. Social: relaciona-se à responsabilidade social e ao impacto das empresas e entidades em prol da comunidade e sociedade. Majoritariamente se refere a temas como respeito aos direitos humanos e às leis trabalhistas; segurança no trabalho; salário justo; diversidade de gênero, raça, etnia, credo etc.; proteção de dados e privacidade; satisfação dos clientes; investimento social; e relacionamento com a comunidade local. Governance ou Governança: está ligado às políticas, processos, estratégias e orientações de administração das empresas e entidades. Entram no tema, por exemplo, conduta corporativa; composição do conselho e sua independência; práticas anticorrupção; existência de canais de denúncias sobre casos de discriminação, assédio e corrupção; auditorias internas e externas; respeito a direitos de consumidores, fornecedores e investidores; transparência de dados; remuneração dos executivos; entre outros. Está intimamente ligado aos dois outros termos (Social e Ambiental), por ser quem dita, orienta, fiscaliza e reporta as práticas sustentáveis (ou não). Setor público Cada vez mais comum no ambiente corporativo das empresas, a agenda ESG também pode ser aplicada pelo poder público em suas atribuições no dia a dia para a população. Ao adotar critérios de sustentabilidade, governança e ações sociais, os administradores públicos, em todas as suas esferas, podem criar novas estratégias que tornem as cidades mais sustentáveis e melhores para as pessoas que vivem ou trabalham nelas.   Um dos compromissos da Agenda 2030, elaborada pela Organização das Nações Unidas (ONU), é tornar os núcleos urbanos mais sustentáveis e seguros para todos os cidadãos. De acordo com a ONU, com a urbanização crescente e acelerada em todo o planeta, é cada vez mais necessária a reorganização e o gerenciamento das cidades, em especial as médias e grandes, para garantir a qualidade de vida da população que reside nelas.   Em março deste ano, o Programa Cidades Sustentáveis – entidade sem fins lucrativos que reúne parceiros como Instituto Ethos, Rede de Cidades e Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações – lançou o Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades-Brasil. O estudo mostra que, das 770 municípios analisados e que compõem o índice, apenas 31 já cumpriram dois terços das metas estabelecidas para a Agenda 2030 da ONU.   Nesse sentido, assim como ocorre nas corporações privadas modernas, as práticas ESG podem se tornar ferramentas importantes na gestão dos espaços urbanos. “Uma cidade inteligente é aquela na qual os aspectos sociais, ambientais e de governança devem estar muito presentes”, explica o estrategista para cidades inteligentes e diretor executivo da EY, Roberto Silva. “A agenda ESG deve estar diretamente conectada ao desenvolvimento das cidades, não apenas das empresas”, completa.  Segundo ele, um município que aplica conceitos ESG na sua administração está mais propenso, inclusive, a atrair maiores investimentos privados no território e na própria administração pública. “Uma empresa vai se sentir muito mais segura e estimulada em participar da concessão de um serviço de saneamento, por exemplo, se souber que ali já são praticadas ações de sustentabilidade”, ressalta Silva. Prática De acordo com a secretária-executiva da Agência Nacional de Saúde Suplementar – ANS, Lenise Secchin; e o especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, Renato Cader, é oportuno frisar que o termo ESG, ao longo dos anos, se disseminou mais nas organizações privadas, até porque seu início se deu com o foco em investidores e empresas. Essa afirmação nos levaria à seguinte indagação: será que o conceito de ESG é aplicável apenas ao setor privado?  “Apesar da sigla ainda ser pouco frequente no setor público, é importante ressaltar que o papel do Estado tem relação direta com os princípios da governança e da sustentabilidade, e os padrões ESG nada mais são do que a conciliação dessas duas perspectivas”, afirmam Lenise Secchin e Renato Cader. Na verdade, o que tem sido praticado são as diferentes dimensões do ESG sendo tratadas separadamente. O tripé do ESG, assim como o da sustentabilidade (ambiental, social, econômico), conhecido como triple bottom line, são esforços no sentido de integrar conceitos e iniciativas que não podem andar separadamente e que confluem para o mesmo objetivo: o bem-estar das atuais e futuras gerações. Conceitos como sustentabilidade e ESG podem ser considerados como caminhos que não têm volta. Quando surgem esses novos conceitos/perspectivas e são disseminadas com peso, é porque de fato algo precisa melhorar, e rápido, pois o tempo urge e as futuras gerações estão cada vez mais ameaçadas. Por outro lado, é importante todos ficarem atentos às organizações que podem se apropriar da ‘virtude’ da adesão ao ESG e, ao mesmo tempo, ocultar outros impactos ambientais ou sociais gerados por elas. Tais instituições são criticadas, muitas vezes, por praticarem o chamado greenwashing – situação em que as organizações se intitulam ‘verdes’, mas, na prática, relegam a segundo plano as práticas voltadas à