Bolívia: Cenário da política econômica perturba Itamaraty

Em encontro recente com presidente boliviano, Lula citou disputa no Brasil em 2014 para endossar direito reeleição de Arce, que está rompido com Evo Morales O governo brasileiro acompanha com atenção a situação econômica, social e política da Bolívia. No momento, o país é uma das principais preocupações do Itamaraty na América do Sul. Apesar de a Venezuela ter sido palco de negociações e comunicados, a avaliação é que qualquer mudança de posicionamento ou declarações só devem ocupar a diplomacia brasileira perto do início do novo mandato presidencial, em 10 de janeiro de 2025 – quando seria necessário voltar à discussão sobre a legitimidade de Nicolás Maduro após eleições com evidências de fraude. Enquanto isso, a Bolívia tem passado por turbulências que podem desencadear manifestações e instabilidades que podem refletir no Brasil, com aumento da vinda de imigrantes, por exemplo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) visitou recentemente a Bolívia e se reuniu com seu colega Luis Arce, após uma tentativa de golpe militar em junho. O brasileiro tentou, inclusive, dar conselhos para acalmar as tensões políticas internas. Além da tentativa de golpe, Arce e o ex-presidente Evo Morales mantêm uma relação conturbada. Morales quer voltar a se candidatar à presidência em 2025, mas está impedido de se candidatar por decisão judicial. Durante a visita à Bolívia, Lula fez uma agenda fechada com movimentos sociais e apoiadores de Luis Arce. De acordo com relatos feitos à CNN, Lula comparou a disputa dos dois com os preparativos para as eleições brasileiras em 2014. Ele citou que, naquela ocasião, houve um movimento que pedia o “Volta Lula”. Entretanto, o petista afirmou que era um direito de Dilma Rousseff concorrer à reeleição e que, por isso, ele não participou da disputa. O relato de Lula buscou mostrar que ele acreditava no direito de reeleição de Arce, apesar da relação positiva que manteve com Morales durante os mandatos anteriores. Economia O país enfrenta uma pressão inflacionária que fez com que, neste mês, Arce aumentasse a militarização na fronteira para impedir o contrabando de alimentos para outros países como Brasil e Argentina. O principal setor econômico, a exploração de gás natural, também enfrenta problemas com as reservas em declínio, o que inibe investimentos estrangeiros no país. O governo boliviano quer expandir os negócios com o Brasil, mas a Petrobras, por exemplo, condiciona o aumento de investimentos no país vizinho a aumento da oferta com preços competitivos. Há também receio de investimentos, já que os brasileiros consideram que a legislação boliviana não tem um arcabouço de proteção e embates com comunidades locais são frequentes. Fonte: CNN Brasil
Crise eleitoral na Venezuela provoca racha na esquerda e é desafio para pretensões do Brasil na arena política mundial

Postura extremamente cautelosa do Itamaraty, que não reconheceu resultado das eleições, é resultado de confluência de fatores que incluem tradição de não-interferência, divisões na esquerda e legado da aliança entre diferentes setores da sociedade brasileira que derrotou ameaça de guinada autoritária nas eleições de 2022. Desde que ocorreram as mais recentes eleições presidenciais na Venezuela, em 28 de julho, o país vive um quadro que combina intensa tensão política e enfrentamento institucional. Nesta segunda-feira, 5/8, o presidente do CNE (Conselho Nacional Eleitoral) da Venezuela, Elvis Amoroso, informou ter entregado as atas relativas a à votação ao Tribunal Supremo de Justiça, (TSJ), o órgão máximo do judiciário nacional. Tanto o CNE quanto o TSJ são alinhados ao governo do presidente Nicolás Maduro (Partido Socialista Unido da Venezuela). No dia 2/8, mesmo sem dispor da totalidade destas atas, o órgão eleitoral confirmou a reeleição de Maduro, com supostos 51,95% dos votos. Porém, o Conselho até agora não havia divulgado as atas, o que era uma exigência do processo eleitoral, e também uma demanda do Brasil e de outras nações para reconhecerem a vitória de Maduro. A oposição contesta o resultado e afirma que o vencedor do pleito foi Edmundo González Urrutia (Plataforma Unitária Democrática). O TSJ solicitou ao CNE a entrega da ata de escrutínio das mesas eleitorais de toda a nação, da ata de totalização final do processo eleitoral, da ata de julgamento e da proclamação das eleições. A presidente do TSJ, Caryslia Rodríguez, confirmou a entrega do material. Disse que o tribunal vai investigar acusações de fraude. A apuração poderá durar até 15 dias. Edmundo González e outros três candidatos da oposição que participaram das eleições de 28 de julho foram convocados a comparecer perante o tribunal na 4ª feira (7/8). A sessão com Maduro foi marcada para 6ª feira (9/8). Segundo a corte, o objetivo é “a consolidação de todos os instrumentos eleitorais que se encontram em posse dos partidos políticos e dos candidatos”. Os citados “deverão entregar a informação requerida e responder às perguntas”. Neste início de semana, Edmundo González divulgou uma carta em que, na prática, também se proclama como vencedor do pleito e pede o apoio dos militares para encerrar o conflito. Os EUA já se posicionaram no sentido de reconhecer Edmundo González como vencedor do pleito atual, mas não o consideram presidente da Venezuela. A União Europeia também não reconheceu os resultados proclamados das eleições venezuelanas. Em comunicado, o bloco disse que aceita a veracidade das atas publicadas pela oposição liderada por María Corina Machado, ratificando que o candidato opositor Edmundo González Urrutia parece ser o vencedor por uma maioria significativa. O governo Lula até agora não reconheceu oficialmente o resultado proclamado pelo CNE, e condicionou este reconhecimento a uma apresentação da documentação eleitoral. Carolina Silva Pedroso, pesquisadora do Instituto de Estudos Econômicos e Internacionais da Unesp e pós-graduada pelo programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Thiago Dantas (Unesp, Unicamp e PUC-SP), analisa o conflito que engoliu o processo eleitoral na Venezuela, e também aborda as divisões que surgiram entre os grupos de esquerda e até mesmo dentro do governo brasileiro. Pedroso explica que este pleito, em particular, atraía muita atenção porque, pela primeira vez desde que o Chavismo chegou ao poder na Venezuela, 25 anos atrás, parecia haver condições concretas para uma vitória da oposição. Como preparação para uma eleição tão importante, governo e oposição haviam inclusive se encontrado em um outro país, Barbados, para acordar o calendário eleitoral e as condições em que a campanha aconteceria. Entre os pontos estipulados estavam a de uma atitude de respeito mútuo e de cordialidade durante a campanha. “O fato de que foi preciso fazer estas definições em um encontro no exterior, ao longo desse primeiro semestre de 2024, era na verdade, era a ponta do iceberg de uma situação muito mais complexa e de enorme disparidade”, analisa ela. Para além de uma rivalidade política, governo e oposição enfrentam profundas divergências quanto aos projetos que sustentam para o país. “E eu diria que são projetos mutuamente excludentes de país. Essa divisão profunda da sociedade venezuelana ficou muito evidente durante a campanha eleitoral. E a própria oposição teve que lidar com suas próprias rivalidades para conseguir se organizar atrás de uma candidatura fortalecida e única. O dia da eleição, embora bastante tenso, foi relativamente tranquilo, e o processo foi acompanhado por uns poucos observadores internacionais. “O problema foi exatamente o fechamento das urnas. Após essa etapa, houve um problema na transmissão dos dados, dos votos dos centros de votação para o Conselho Nacional Eleitoral, que é esse centro que é esse poder, na verdade constitucional, independente, que organiza as eleições no país”, diz. O CNE alega que passou por um processo de ataque hacker de cunho terrorista. A oposição, por sua vez, diz que, no momento da transmissão dos dados, muitos dos seus observadores e testemunhas partidárias não puderam estar presentes para verificar se o processo estava acontecendo da maneira como consta no regulamento eleitoral do país. “Então nós não temos certeza quanto ao número exato de pessoas que foram votar. A oposição alega um determinado número. O governo alega que determinado número mais do que dá para saber que foi em torno de mais ou -60% do universo total de pessoas que estavam aptas para votar. E a grande questão não é nem só quantas pessoas foram votar, mas sim quantos votos cada candidato obteve”, diz. Na contagem oficial do Conselho Nacional Eleitoral, Nicolás Maduro teria recebido pouco mais de 5 milhões de votos, enquanto o seu adversário mais direto, Edmundo González, teria tido cerca de 4.400.000 votos. Porém, a oposição diz ter tido acesso a parte da documentação oficial das urnas eletrônicas e que, na verdade, Edmundo González foi o vencedor. O Conselho Nacional Eleitoral, até o presente momento, ainda não apresentou essas atas, todas na sua totalidade e separadas por centro eleitoral, que comprovariam aquele total que foi divulgado como resultado oficial. “Em linhas gerais, esse é o cenário da Venezuela hoje.” Posicionamento